sábado, 23 de janeiro de 2010

Um Pouco De Mim

Este mim que fugiu da mimada filha única, para aprender a repartir o pão com uma ninhada de primos filhos de uma tia. A tia mais querida do mundo.
Foi com ela que aprendi o muito que sei de educar e amar. Foi com ela também que aprendi a embalar os sonhos e só desembalá-los quando o momento for oportuno. Foi assim que ocultei meu grande sonho de ser escritora.
Tornei-me costureira muito cedo e foi nessa honrosa profissão, que já na adolescência dei meus primeiros pontos. Lembro-me bem de ter costurado uma perda com pontos de saudade, depois de muitos furos nos dedos fui trabalhar como secretária em um consultório, o médico era competente e muito mal humorado. Descobri logo que poderia costurar aquele mau humor com pontos de ternura, porém, esses pontos foram virando um nó tão mal compreendido que me obrigou a procurar um novo emprego. Ele ficou tão ofendido que rasgou o pano da amizade e por pouco não o jogou na lama.
Continuei com minhas aulas de costura, aprendi que tem o ponto e a linha certa para cada pano. Para aquele pano eu havia soltado linha.
Apreendi a lição e continuei costurando os panos. Ao aprender o ponto certo do amor casei, mas tive o cuidado de costurá-lo com linha apropriada, pois o casamento é um tecido muito frágil, é quase um papel de seda, rasga-se com muita facilidade, não envolvam crianças com este pano, sem ter a certeza de que ele foi bem reforçado com os pontos do amor.
É uma árdua tarefa, muitas vezes basta um ponto errado para por a perder um belo trabalho.
Eu, com as experiências da vida, mais os ensinamentos da minha tia, que me avisou: leve no enxoval uma boa quantidade de paciência, uma grande dose de respeito e linha, muita linha para dar os pontos necessários de amor. Cheguei aqui, o tecido continua intacto apesar de ter embalado cinco crianças e agasalhar atualmente vinte aves aninhadas sob nossas asas.
O sonho que embalado guardei, estou pacientemente desembalando. Surge aqui e acolá algumas crônicas, poesias e contos assinados por mim, aquela “mim” que escapou dos mimos pelas linhas tortas escritas por Deus, espera em breve estar assinando romances.

Emília L. Goulart
25-11- 2007